A Árvore que Tinha Medo de Insetos

Era uma vez, uma menina. Um dia, ela precisou fugir, e fugiu. Chegou a um bosque bonito, de árvores altas e frondosas, com esquilos e coelhos por toda parte. O solo era atapetado com gramíneas, e pequenas borboletas coloridas voavam ao longe. Os pássaros chilreavam, e o mormaço deixava o clima perfeito.

A menina tinha um livro, grande e bonito, que estivera com ela a vida toda. Ela encontrou uma clareira no bosque, confortavelmente iluminada pelo mormaço, e se recostou numa das árvores. Abriu o livro sobre os joelhos dobrados e leu, novamente, página por página daquele volume já surrado. Apreciou o toque do papel e o aroma característico que ele exalava.

Ao terminar, o sol já se punha. A tristeza e a desesperança não tinham ido embora, ela notou, apesar da distração. Não queria ir pra casa. Deitou-se na relva macia e observou o céu, perdida em seus pensamentos. Uma estrela cadente. Queria ser uma árvore. Árvores abrigavam vida. Eram bonitas e fortes. Permitiam vida. Era o que queria fazer. E adormeceu.

Acordou com fome. E, em questão de segundos, a fome passou. O alimento a satisfazia por inteiro, cada parte de seu corpo. Sentia-se fresca, o vento balançava suas folhas com carinho. Seu desejo tinha sido concedido. Finalmente, era feliz.

Tudo estava bem, até que um besouro começou a subir em seu tronco. E a furá-lo. Ela entrou em pânico. Aquilo doía, e ela se sentia arrepiar de cócegas e nojo a cada passo do animal. Era um besouro. Imenso. Se tivesse um coração, ele estaria a todo vapor agora. Notou então todas as joaninhas nos seus galhos e uma colmeia que se formava. Larvas e pulgões comiam suas belas folhas. Mariposas imensas pousavam em sua casca, e toda sorte de artrópodes a escalavam. Era pior que em seus piores pesadelos.

Passou dias aterrorizada. Não entendia como as outras árvores conseguiam suportar o toque nojento daqueles animais, com suas perninhas de quitina e zumbidos irritantes. Pra piorar, os malditos apareciam de surpresa, vindos de todas as direções, e eram mais raros os que ela conseguia espantar do que os que se apoderavam de seu corpo. Chorara muito. Não podia viver com aquilo. As sensações causadas pelos pequenos animais eram repudiantes, assim como seus hábitos. O asco predominava nela de tal forma que parou de se alimentar. Ficou fraca, seu tronco já não tinha a mesma consistência, suas folhas começavam a cair, seus galhos murchavam. E então, os insetos começaram a ir embora.

Com os insetos, os pássaros e os esquilos também partiram. A árvore ficou sozinha, inconformada de ter sido abandonada por aqueles de quem gostava. Já não tinha forças pra chorar. Suas raízes não absorviam mais nada, devido à tristeza e à desesperança. Imóvel, à beira da morte, a árvore olhou para o céu. Uma estrela cadente. Queria ser menina de novo. Quando menina, podia ler, e cantar, e abraçar, e escrever, e respirar, e comer doces. Podia sorrir e cirandar, ir à casa dos amigos de bicicleta para uma limonada numa tarde quente e usar vestidos bonitos que vovó lhe fazia. Era o que queria fazer. E adormeceu.

Acordou exaltada, sentindo que algo lhe subia pela perna. Sentou-se, de súbito, e viu um pontinho vermelho quase alcançando seu joelho. A menina sorriu. Pegou uma folha seca na relva e deixou que o animalzinho subisse nela. Colocou a joaninha na relva, levantou-se, bateu a saia do vestido e voltou para casa. Era uma tarde quente. Vovó a esperava com uma deliciosa limonada. Era feliz.